Capítulo 4

   Cherrygrove City era uma cidade pequena e com poucos habitantes. Alguns canteiros de flores davam à cidade um perfume agradável, misturado com a brisa do mar. Havia ali uma pequena praia que dava vista a uma ilha localizada à leste da cidade. A cidade tinha um Centro Pokémon e um Poké Mart, sendo bem convidativa aos treinadores iniciantes que desejavam descansar e comprar itens para a viagem.

   Nate descansava na na praia, aproveitando o silêncio daquela área enquanto esperava a volta de Lyra do Poké Mart. Leon já estava recuperado da batalha contra o Aipom de Wess, e agora jazia ao lado de seu treinador. Já o Chikorita da garota brincava num canteiro de flores próximo à praia enquanto esperava a volta dela.

   O rapaz adorava o mar e tudo o que tinha a ver com a água. Aquilo sempre o tranquilizava de maneira quase inexplicável. Sentia um bem estar enorme, e tinha a vontade de nunca mais sair de lá. Seu Cyndaquil não compartilhava o mesmo gosto, estava ali apenas para fazer companhia ao dono. 

   Não demorou muito para Lyra encontrar o garoto. Sentou-se ao seu lado na companhia de seu Pokémon sem dizer nada, apenas contemplando aquela paisagem. 

   - Oi - disse o rapaz, antes de fechar os olhos.

   Ele queria aproveitar melhor aquele momento, relaxar mais. Estava nervoso para seu primeiro ginásio em Violet City, principalmente ao se lembrar que deveria honrar o título de "aprendiz da Clair". Porém, acabou relaxando tanto que não percebeu quando um Pokémon subiu em cima dele. De início pensou se tratar de Leon, logo mandando ele sair. Seu Pokémon o encarava confuso, mas ao ver qual criatura realmente rastejava sobre seu treinador, entendeu o que estava acontecendo. Lyra abafava uma risada enquanto via o Pokémon selvagem descansar no colo de seu amigo, apenas esperando ele abrir os olhos para cair na gargalhada.

   Nate enfim percebeu que havia algo errado e abriu os olhos. Ao notar quem incomodava seu descanso, arregalou os olhos e pulou de susto. Tratava-se de uma criatura semelhante à uma joaninha vermelha com cinco pontos pretos em suas costas, olhos grandes e esbugalhados e que andava com seis patas. Era uma Ledyba, o Pokémon Cinco Estrelas.

   - O que... O que... O QUE ESSE BICHO TÁ FAZENDO AQUI?!?!

   Lyra estava quase sem fôlego de tanto rir. Sabia muito bem que o garoto tinha medo de insetos, e colocara aquela Ledyba ali de propósito.

   - Sai daqui, bicho feio, sai!!! Leon, Tackle!

   Seu Cyndaquil aprontou-se animadamente para a batalha. Odiava perder e a derrota para o Pokémon do rival de seu treinador o deixara perturbado, mas aquilo não aconteceria novamente.

   Porém, Lyra pegou uma Pokébola e recolheu Ledyba. Nate a encarou surpreso, só então percebendo que o inseto era dela.

   - Nem pensar! Não vou viajar com essa coisa! Pode esquecer!

   - Eu não vou abandonar a Starx por causa desse seu medo bobo - disse ela. - Você parece uma mulherzinha. 

   - Tô falando sério, Lyra. Ou ela, ou eu.

   Claro que a garota não levou aquilo a sério, afinal, seu amigo gostava de brincar e tinha a péssima mania de dizer coisas sem pensar. Quando percebeu o que tinha acabado de falar, tratou de se desculpar.

   - Foi mal! Não quis falar isso. Eu quero viajar com você, mas... Um tipo inseto? É sacanagem. 

   - Não tenho culpa se você é um medroso.

   Nate arqueou uma sobrancelha.

   - Não tem?

   Lyra voltou a rir ao lembrar daquele episódio que dera origem à fobia de Nate, mas era uma longa história. De qualquer forma, não deixaria de cuidar de sua nova Ledyba, Starx, por causa daquilo. Não se pode quebrar promessas como aquela.

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   Lyra havia acabado de sair do Poké Mart e já avistara Nate e Leon na praia. Seu Chikorita logo a viu e correu em sua direção animadamente. Ele circulou sua treinadora e parou para que ela afagasse sua cabeça. Juntos, começaram a caminhar em direção à praia, mas sua atenção logo foi desviada pela Rota 30.

   Três joaninhas, todas com quatro braços, duas antenas pretas e uma mancha preta entre elas e com grandes olhos azuis flutuavam em torno de uma Ledyba - as antenas pequenas indicavam que era uma fêmea. A pequena tremia perante os três Ledians, sua forma evoluída. 

   

   Lyra aproximou-se deles para observar melhor a cena. A Ledyba tentou alçar voo, mas acabou caindo. Os Ledians permaneceram no mesmo lugar, a encarando e esperando que ela conseguisse voar. Ela tentou mais uma vez; porém, falhou novamente. Dois dos Ledians foram embora, apenas um continuou a encarar a pequena. Ela baixou os olhos, envergonhada, e o outro Pokémon saiu voando atrás dos outros em seguida. Aquele que parecia ser o único a acreditar nela também havia desistido, e isso fora pior do que uma facada nas costas. 

   A garota caminhou até a Ledyba, que encolheu-se num canto ao vê-la se aproximando.

   - Está tudo bem - disse ela. - Não quero te machucar.

   A pequena continuava apavorada. Assim, Lyra pediu que seu Chikorita conversasse com ela. Ela não entendia a linguagem de Pokémons, mas o que quer que o Pokémon Folha tenha dito acalmou a Ledyba, que aos poucos foi chegando mais perto da jovem.

   - Você não consegue voar?

   O Pokémon inseto gemeu, envergonhada. Mesmo sendo do tipo voador não conseguia alçar voo, considerava-se uma vergonha para sua espécie.  - Tudo bem. Você vai conseguir. Eu te ajudo.

   A Ledyba a encarou com aqueles olhos esbugalhados. Acabara de perder a confiança daquele Ledian, e logo em seguida uma jovem treinadora apostava suas fichas nela. Agora tinha esperanças de que um dia abriria as asas e voaria livremente.

   Lyra sacou uma de suas Pokébolas vazias.

   - Prometo que farei você voar. Você será a Ledian mais bela da região.

   Como a pequena não havia mostrado sinais de relutância, Lyra encostou a cápsula na Ledyba, que foi sugada para dentro dela. Uma luz vermelha piscou algumas vezes e logo parou, indicando a captura sucedida.

   - Eu prometo, Starx. Você alcançará as estrelas. 

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   O Cyndaquil e o Chikorita ficaram brincando perto por ali enquanto Lyra contava o ocorrida à Nate. Ela tinha Starx no colo, e o jovem continuava incomodado com sua presença, mas era o Pokémon de sua amiga. Eles ainda ficariam juntos por bastante tempo. Ela não a capturara com a intenção de zoar o garoto, era apenas seu grande coração tomando conta de seus atos.

   - É bom que você cumpra essa promessa, viu? 

   - Eu vou! Não prometeria algo que não pudesse cumprir.

   Nate ficou bem interessado quando ela disso aquilo levantou-se e segurou sua mão, a levantando em seguida.

   - Então temos algumas contas para acertar.

   - O quê? Nate...

   - Uma vez você disse que ainda iríamos nadar aqui - lembrou ele. - Já temos idade pra isso, não?

   - Mas...

   - Vai me dizer que não sabe nadar? Vamos, eu vi você colocando o maiô na bolsa. Vem logo!

   - Eu ainda preciso me trocar, idiota!

   O jovem continuou rindo como uma criança enquanto puxava Lyra para a beira do mar. Então ele parou, toda a sua animação havia desaparecido. Não foi por causa das reclamações de sua amiga, e sim pelo que ele viu. Perto deles um homem brincava com o filho, o menino insistia em pedir para brincar na água, mas seu pai dizia que ainda não podia. Lyra seguiu seu olhar e logo entendeu o desconforto do rapaz. Retornou Starx para a Pokébola e chamou os outros dois, enquanto Nate se caminhava de cabeça baixa em direção ao Centro Pokémon.

   A garota o encontrou sentado em um dos sofás no saguão do Centro. Leon subiu no colo de seu treinador com o intuito de consolá-lo.

   - Você está bem? - Perguntou Lyra.

   - Me deixa sozinho, por favor.

   A garota assentiu e dirigiu-se para a saída. Entretanto, Nate segurou sua mão, fazendo-a se virar.

    - Não, fica.

    Lyra sorriu. Sentou ao lado de seu amigo depositou sua mão sobre a dele. Aquele gesto o acalmou um pouco, pois demonstrava que sua amiga continuava se importando com ele mesmo depois de anos. Esperava que ainda pudesse retribuí-la, mas naquele momento só queria algumas horas de cochilo.

   O que deveria ser um cochilo acabou por ser uma tarde inteira de sono, devido ao pesadelo que tivera. Nate acordou à noite, em seu quarto no Centro Pokémon. Devia ter acabado de anoitecer. Lyra provavelmente dormia em seu quarto, ela ficara horas esperando que o amigo despertasse, mas quando percebeu que ele dormiria mais do que o esperado resolveu descansar também.

   Nate ficou deitado em sua cama fitando a parede. Seu Pokémon dormia aos pés da cama. Ele não conseguia mais pegar no sono, só lhe restava esperar que o sono viesse com o tempo. Fechou os olhos e tentou não pensar em nada. Contudo, ouviu um pio. Abriu os olhos imediatamente, colocou seu boné e sua jaqueta e saiu do prédio, ao lado de seu Cyndaquil. 

   Treinador e Pokémon saíram da cidade e pararam na Rota 30. Ele olhou para as árvores, procurando a origem daquele som, até que viu um par de olhos avermelhados. Era uma pequena coruja que o observava naquela noite silenciosa, como se perguntasse o motivo para aquela aparição inesperada. Hoothoots e Noctowls assumiam o controle da noite, enquanto os humanos dormiam calmamente em suas camas confortáveis.

   O que Nate via no topo daquela árvore não era simplesmente um Pokémon, e sim mais uma figura solitária naquela noite. Então ele sorriu com esse pensamento. Ali estava mais uma criatura com a qual ele se identificava, e aquilo já era um bom motivo para capturá-lo.

   - Também está sozinho?

   Hoothoot ficou em silêncio. Nate continuou o encarando lá de baixo curiosamente. Impaciente, a coruja desceu da árvore, parando em frente do garoto. Leon assumiu a posição de batalha, sempre disposto a lutar contra alguém. E dessa vez ele venceria.

   - Vamos pegá-lo - disse Nate - Leon, comece com Tackle!

   O Pokémon avançou numa investida e acertou em cheio. O voador logo se recuperou, abriu o bico e soltou um grito estridente que perturbou Leon. Aquele era o Growl, movimento que diminuía o poder de ataque do oponente. Após fazer isso, atacou com um Tackle.

   - Evasiva!

   Leon desviou por pouco, mas o Hoothoot não desistia. Atacou mais uma vez, finalmente tendo sucesso. Como se não bastasse isso, com seus olhos brilhando, o Pokémon selvagem disparou ondas hipnóticas no Cyndaquil, que por sua vez acabou caindo.

   - Leon! Resista cara, você consegue!

   Leon não havia sido derrotado; estava dormindo. Fora atingido pelo Hypnosis, um golpe de status Psíquico que fazia o Pokémon dormir. Agora dependia apenas de Nate. Ele pulou para agarrar o Hoothoot, que desviou facilmente. Mas ao invés de ir embora, ele usou a pata para juntar algumas pedrinhas, e depois de um tempo formou a frase:

Se o jovem não vai até Ícaro,

Ícaro vai até o jovem.

   - Impressionante - admirou-se Nate. - Então seu nome é Ícaro?

   Mudando as pedras de lugar, Ícaro formou a palavra:

Sim.

   - Meu nome é Nate. Nate Silver - se apresentou. - Bem... O que você quer dizer com isso? Que quer vir comigo?

   Ícaro lançou um olhar na direção do sonolento Cyndaquil e usou as pedras para escrever:

Seu amigo é interessante. Se o senhor permitir, gostaria de acompanhar sua evolução. Quero vê-lo melhorar suas habilidades e ter outra batalha com ele um dia.

   Dois Pokémons do mesmo time batalhando? Nate adoraria evitar qualquer conflito entre seus parceiros, mas se era uma batalha amigável que visava apenas treinar Leon... 

   - Eu adoraria contar com você em minha equipe. Mas se quer saber, Leon odeia perder. 

O treinamento também pode melhorar seu psicológico. Garanto que ele será muito mais tolerante depois de algum tempo.

   Nate só então percebeu que estava sem sua mochila, portanto estava sem suas Pokébolas. Ícaro percebeu isso e voou até pousar em seu braço. O rapaz continuava surpreso com a inteligência do Pokémon, tê-lo no time lhe daria grandes vantagens. Com algum treinamento ele logo teria ótimos movimentos, e se tinha alguém que poderia preparar Leon psicologicamente para novos desafios, era ele. O garoto pegou seu primeiro Pokémon no colo e, com Ícaro voando ao seu lado, retornou ao Centro Pokémon.